Os palácios dos judeus de Damasco
Até há algumas décadas viviam na Síria muitos judeus sefarditas, descendentes dos judeus expulsos de Portugal e Espanha no séc. XV e que foram acolhidos no Império Otomano. Uma dessas famílias, que vivia em Damasco, tinha o apelido Lisbona, e foi em tempos muito abastada. Era conhecida, também, pelo seu filantropismo. Alguns deles construíram belas residências na Cidade Velha, verdadeiros palácios de mármore. A Maison Lisbona, ou Beit Lisbona, foi erigida por esta família de comerciantes no séc XVIII, nas vizinhanças da Grande Sinagoga. Com as suas portas em madeira entalhada, enfeites em folha de ouro, tectos pintados e incrustações nacaradas nas colunas em pedra esculpida, a Beit Lisbona era, segundo os relatos de quem a visitou durante os séculos seguintes, dos mais belos edifícios em Damasco. “Como as casas dos muçulmanos eram fechadas a estrangeiros, os turistas eram levados para visita em residências de judeus ou de cristãos”, lê-se neste artigo da página judaica brasileira Morashá. “O esplendor das residências é revelado nos relatos de ocidentais que visitaram Damasco, à época. George William Curtis, convidado em 1852 à casa de um comerciante judeu, escreveu: "É um palácio de sonho... A luz do dia espalha-se ao longo do pátio espaçoso... um amplo reservatório em mármore ocupa o centro desta área onde fontes decoradas despejam torrentes d'água... plantas frondosas ladeiam a fonte. Rosas, limões e laranjeiras confundiam suas folhagens, entrelaçando suas flores e inebriando o ar com seu perfume... Construídas pouco acima do nível do pátio e abrindo para o mesmo, há alcovas grandiosamente arqueadas, atapetadas e com divãs luxuosos. As paredes e o teto das alcovas são pintados com arabescos de sonho...". A maior parte da comunidade judaica síria emigrou para Israel ou outras partes do mundo. Estes palácios encontram-se hoje, salvo raras excepções, em ruínas. Na Maison Lisbona chegou a estar instalada uma escola infantil - a escola Maimonides - para a comunidade judaica, até início dos anos 90. Podem ver algumas fotos desse tempo nesta página: https://www.flickr.com/photos/dlisbona/97478506/in/photostream/ [Foto: pátio da Beit Lisbona, início do séc XX]
Revista Morasha / Brasil
Artigo publicado no site www.farhi.org, A description of the Farhi Houses, In 18th & 19th century Damascus
Artigo de Jacques Stambouli, La Maison Stambouli, publicado na revista L'Arche, novembro de 2007
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Fonte: http://www.morasha.com.br/comunidades-da-diaspora-1/os-palacios-dos-judeus-de-damasco.html
Os palácios dos judeus de Damasco
‘A maior glória de Damasco é o esplendor de suas residências’, escreveu Josias Porter, em 1855, ao se referir à extraordinária opulência e beleza das mansões da Cidade Velha. Entre as mais bonitas, imortalizadas em imagens por artistas famosos, havia várias residências de famílias judias.Revista Morasha / Brasil
Quando, na segunda metade do século 19, Damasco abre-se ao
Ocidente e intensifica o comércio com os países europeus, as companhias
estrangeiras passam a usar representantes locais em suas transações.
Estes parceiros de negócios dos europeus eram quase todos cristãos ou
judeus. Esse comércio fez com que várias famílias judias e cristãs
acumulassem grandes fortunas. O reverendo Josias Porter, autor do
Murray's Handbook, guia publicado em 1855 para turistas interessados em
conhecer a Síria e a então Palestina, assim se referiu à comunidade
judaica de Damasco: "Os judeus da cidade não são numerosos, mas são
muitos influentes devido à grande riqueza de algumas de suas famílias".
As residências de famílias proeminentes, como os Farhi, Lisbona,
Stambouli, Totah e Anbar, localizadas em Hara Al-Yahud, o bairro judeu,
situado a sudeste da Cidade Velha, eram visitadas como se fossem museus.
Com a abertura ao Ocidente, europeus e norte-americanos passaram a
incluir Damasco em seu roteiro ao Oriente e queriam ver os seus famosos
"palácios de mármore ". Como as casas dos muçulmanos eram fechadas a
estrangeiros, os turistas eram levados para visita em residências de
judeus ou de cristãos. Em seu Handbook, o autor aconselhava a quem as
quisesse conhecer que procurasse pelo "velho Abu Ibrahim, o cicerone
judeu que guia os viajantes às casas judias... Beit Lisbona e Beit Farhi
são de uma beleza excepcional".
O esplendor das residências é revelado nos relatos de ocidentais que
visitaram Damasco, à época. George William Curtis, convidado em 1852 à
casa de um comerciante judeu, escreveu: "... um palácio de sonho... A
luz do dia espalha-se ao longo do pátio espaçoso... um amplo
reservatório em mármore ocupa o centro desta área onde fontes decoradas
despejam torrentes d'água... plantas frondosas ladeiam a fonte. Rosas,
limões e laranjeiras confundiam suas folhagens, entrelaçando suas flores
e inebriando o ar com seu perfume... Construídas pouco acima do nível
do pátio e abrindo para o mesmo, há alcovas grandiosamente arqueadas,
atapetadas e com divãs luxuosos. As paredes e o teto das alcovas são
pintados com arabescos de sonho...".
Pintores e fotógrafos imortalizaram em suas obras as mansões da
Cidade Velha. Várias fotografias de Felix Bonfils, em preto e branco,
mostram as casas em seu apogeu. O artista, fotógrafo francês que viveu
na segunda metade do século 19, ficou famoso pelas imagens que retratam
as últimas décadas do Império Otomano.
Infelizmente, pouco resta atualmente da beleza das antigas casas da
Cidade Velha de Damasco. Várias foram demolidas em função de supostos
projetos de modernização da área; outras, após terem sido abandonadas
pelos proprietários, estão em estado deplorável. Muçulmanos e cristãos
as deixaram para ir morar nos bairros novos da cidade; os judeus as
abandonaram quando compreenderam que a vida judaica na Síria chegara ao
fim. A maioria das mansões dos judeus, que tanto deslumbramento
causaram, são hoje cortiços. Desapropriadas pelo governo, eram quase
sempre entregues a refugiados palestinos ou aos mais carentes na
população. Algumas, com um pouco mais de sorte, foram compradas por
muçulmanos de posses ou, mais recentemente, por investidores
estrangeiros.
Apesar do decreto governamental de 1972, determinando a preservação
da Cidade Velha, e do fato de ter sido considerada pela UNESCO
Patrimônio Histórico da Humanidade, até hoje pouco foi feito para
preservar esta parte da cidade e as antigas mansões.
A jornalista britânica Brigid Keenan, esposa de um diplomata, viveu
cinco anos em Damasco (1993 a 1998) e, encantada com as mansões da
Cidade Velha, iniciou um projeto conjunto com o fotógrafo Tim Beddow, do
qual resultou um livro, Damascus, Hidden Treasures of the Old City
(Damasco, tesouros ocultos da Cidade Velha). Entre as mansões
fotografadas, cinco haviam pertencido a famílias judias de destaque na
vida local: Beit Farhi, Beit Dahdah, Beit Stambouli, Beit Lisbona, Beit
Totah e Beit Anbar. (Maktab 'Anbar).
Arquitetura da época
Todas as mansões da Cidade Velha de Damasco - fossem de famílias
muçulmanas, cristãs ou judias - seguiam os padrões da arquitetura
islâmica no projeto arquitetônico e na estética, caracterizada por
inegável paixão pela cor e pela riqueza de seus interiores. Para a
execução dos elaborados projetos eram contratados artesãos de
virtuosismo técnico e sensibilidade artística, especializados no
trabalho em madeira, metal, vidro, mármore e pedra, além de exímios
pintores.
A típica casa damascena, Beit em árabe, era ampla, pois várias
gerações de uma mesma família a habitavam, em conjunto. Sempre voltada
para seu interior, a casa era construída em volta de um ou mais pátios
(ard al-diyar ) Os muros que a circundavam, assim como a porta de
entrada, eram de uma simplicidade extrema, impossibilitando a quem
caminhasse pelas ruelas escuras e sujas da Cidade Velha adivinhar a
riqueza que se escondia atrás dos mesmos. Já os muros que davam para o
pátio eram elaborados. Geralmente em pedra preta e branca, eram
decorados com vivo trabalho em pasta de pedra colorida. Esta técnica
decorativa, desenvolvida pelos mamelucos e que atingiu a perfeição na
Damasco do século 18, consistia em blocos de pedra gravados com motivos
geométricos, esculpidos na pedra. Seus sulcos eram preenchidos com pasta
de pó de pedra colorida. A beleza do resultado enchia os olhos.
O pátio era projetado para refrescar os verões quentes e secos da
Síria. Em seu centro sempre havia uma fonte, que, no verão, mantinha a
umidade do ar, perfumado pelas roseiras e jasmineiros. Árvores de
frutas, como de kabad, uma espécie de limão grande, ou de naranj,
laranja da terra, e videiras davam sombra e frutos. Até o século 19, os
pátios eram pavimentados de basalto preto, com intrincados desenhos em
pedras vermelhas. Daí em diante passou-se a usar mosaicos de mármore no
revestimento dos pisos.
Todas as mansões contavam com uma profusão de fontes e chafarizes,
que ornavam pátios e o interior das casas. O sistema de abastecimento
d'água da Cidade Velha, que remontava à Antigüidade, era impressionante.
As casas eram alimentadas pela água canalizada, que era distribuída de
fonte em fonte até chegar à cozinha e aos lavatórios. Até o século 19,
quando passaram a ser de mármore, as fontes eram em pedra,
principalmente nos pátios. No interior das casas, eram menores e bem
mais trabalhadas, muitas vezes em mosaicos de mármore com incrustações
em madrepérola.
Na parte sul da casa, abrindo em direção ao norte, em linha reta com a
fonte do pátio, ficava o liwan, o principal cômodo da casa, onde a
família e os hóspedes ficavam no verão. Era um recanto amplo e alto,
fechado em três lados - o lado aberto em arco sempre se abria para o
pátio. A decoração desse local era deslumbrante: o teto em madeira
ricamente pintada, detalhes em pedra esculpida e com incrustações
formando mosaicos, paredes com afrescos e, ainda, pisos em mármore com
desenhos tão rebuscados que mais pareciam tapetes persas.
No pátio, do lado oposto ao Iiwan, beneficiando-se do sol invernal,
localizava-se o principal salão de recepções, qâ'a, que era fechado.
Este salão era o ponto alto de toda a casa; era onde melhor se podia
admirar o gosto dos proprietários e toda a técnica e sensibilidade
artística de seus arquitetos e artesãos. Um grande arco dividia o qâ'a
em dois ambientes. Uma área de entrada, no mesmo nível que o pátio,
chamada de ataba, e uma sala de estar, a mastaba. As residências maiores
chegavam a ter duas mastabas, uma de cada lado da ataba.
Estes dois ambientes diferiam muito em sua decoração, ainda que
fizessem fazer parte da mesma sala. Pavimentada em pedra ou mármore, com
uma fonte no centro, a ataba tinha suas paredes decoradas em pedra
trabalhada. Já a mastaba tinha as paredes decoradas com painéis em
madeira pintada e entalhada, com douração. O piso, mais elevado, em
pedra ou mármore, era coberto por tapetes persas, havendo, encostados
nas paredes almofadas de seda ou divãs baixos (divan, em árabe). Nesse
local as famílias e seus freqüentes hóspedes sentavam-se, durante o
inverno. Em volta do pátio havia outras salas, também com opulenta
decoração.
Nas antigas casas damascenas, os cômodos não tinham finalidade
definida. Durante os invernos, as famílias viviam no andar térreo, mais
quente, em virtude das paredes e tetos serem em madeira. Qualquer cômodo
podia ser rapidamente adaptado para servir de sala de jantar ou de
dormitório, pois as refeições podiam ser servidas em bandejas, e havia
armários nas paredes que continham colchões, que podiam ser rapidamente
estendidos no piso. Somente no final do século 19, por influência
européia, começam a surgir casas com salas de jantar ao gosto europeu.
Os tetos das mansões eram verdadeiras obras de arte. Geralmente de
madeira, eram pintados com tanto requinte e detalhamento que pareciam
tapetes orientais. Em fins do século 19, por influência da Europa, estes
passam a ser de madeira e tela, pintadas com motivos ocidentais.
As mansões do Bairro Judeu
Em 1936, quando os franceses governavam a Síria, os engenheiros
militares fizeram um detalhado plano cadastral da Cidade Velha de
Damasco, mapeando todas as casas e seus pátios e fontes. Apesar do plano
facilitar a identificação das casas, não é tarefa fácil pesquisar a
história desses palacetes, dificultada pelo fato de que cada novo
proprietário emprestava seu nome à casa. É o caso das mansões dos judeus
na Cidade Velha, originalmente conhecidas pelo nome do proprietário
quando da construção. Atualmente ocupadas por outros donos, tiveram seus
nomes mudados. Mesmo assim, a população de Damasco ainda se recorda do
nome original das mais famosas.
Beit Farhi
Os Farhi eram uma das famílias mais importantes e ricas de Damasco e,
sem sombra de dúvida, a mais proeminente da comunidade judaica do
século 19. No início desse século, o homem mais rico da Síria era Haim
Farhi, conhecido como o Haim Al-Moualem, o professor, em árabe. De 1789 a
1818, ano em que foi morto, Haim Farhi desempenhou as funções de Vizir
financeiro (cargo semelhante ao de um ministro), banqueiro e
administrador do notório governador otomano de Saida e Damasco, Ahmad
al-Jazar. Era assim chamado por sua crueldade, pois al-Jazzar significa
carniceiro.
A família Farhi era, na época, uma das maiores proprietárias de
imóveis da cidade. Segundo um estudo sobre a comunidade judaica de
então, 24 casas e terrenos foram adquiridos pela família apenas nesse
período, em Damasco, não apenas no bairro judeu, mas também em outras
áreas da cidade.
No século 19, a casa mais luxuosa e famosa do bairro judeu e uma das
maiores de Damasco era a Beit Farhi, ou Beit Al-Moualem, nome de seu
proprietário, Raphael Al-Moualem. É a casa retratada, em 1873, pelo
pintor inglês sir Frederic Leighton, na tela Colheita de limões, que
Morashá reproduz em sua capa, nesta edição. Na tela vê-se o pátio da
residência em seus dias de fausto, com duas senhoras e uma criança,
provavelmente da família Farhi, colhendo limões em uma das árvores da
casa. Parte do acervo do Leighton Trust, o bonito quadro está exposto na
Academia Real de Artes, de Londres.
Ocupando um quarteirão inteiro do bairro, a mansão provocava espanto e
admiração em quem a visitava. Por exemplo, Lady Hester Stanphope, que a
visitou em 1812, relatou que "se parecia a um palácio de contos de
fada, com seus quatro pátios internos e paredes vivamente ornadas em
ouro, espelhos, tetos pintados com imitações de pedras preciosas
incrustadas e pisos de mosaicos". Apesar de ser, ela mesmo, membro da
nobreza, isto não diminui o encantamento com que descreve as xícaras em
que lhe serviram café, "com incrustações em ouro maciço".
John Wilson, na obra "Terra da Bíblia" (1847), narra sua visita à
Beit Al-Moualem. "No dia 8 de junho, visitamos a mansão de Raphael, o
chefe do clã dos Farhis, o Nasi dos judeus de Damasco... Um dos
viajantes britânicos que estava conosco disse duvidar que os nossos
próprios palácios reais fossem superiores àqueles... Em um dos
apartamentos principais, a inscrição em hebraico invocando a bênção de
D'us sobre seus moradores é esculpida e pintada em ouro, em belas letras
grandes... Visitamos a biblioteca, de considerável extensão. É usada,
às vezes, como sinagoga particular. Contém três lindos Rolos da Lei,
acondicionados na mais rica arca de prata que meus olhos já avistaram.
Além disso, lá se encontra uma cópia da Bíblia, de cerca de 450 anos,
com esplêndidas iluminuras e coloridos".
Depois da criação do Estado de Israel, em 1948, a casa foi habitada
por várias famílias palestinas, que a dilapidaram. O complexo de Raphael
El-Moualem foi comprado recentemente por um arquiteto, que pretende
restaurar o local, devolvendo-lhe a glória passada para transformá-lo em
hotel de luxo.
Apesar de não ser tão luxuosa como a de Raphael El-Moualem Farhi, a
residência de Mourad Farhi também era das mais bonitas de Damasco. Sobre
Beit Farhi, hoje chamada de Beit Dahdah, John Wilson escreveu:
"Visitamos a casa de Mourad Farhi, uma das mansões principescas dos
Farhi, os mais ricos banqueiros e comerciantes de Damasco. Visitamos a
biblioteca, que continha todo o universo da vasta literatura judaica... A
biblioteca era aberta a todos os judeus locais, tanto para visitação
quanto para consulta. Quatro rabinos da comunidade e algumas
personalidades nos esperavam, à entrada, para nos dar sua calorosa
acolhida a Damasco...".
Até 2006, o Beit Mourad Farhi, ou Beit Dahdah, pertencia a um rico
antiquário, que ali morava e mantinha sua loja. Foi comprado pelo
escultor Mustafá Ali. Infelizmente desaparecem todas as referências aos
antigos proprietários e os símbolos judaicos das paredes originais foram
raspados ou tapados por jornais. Uma das 24 residências Farhi na Cidade
Velha de Damasco foi transformada no Hotel Talismã, que pode ser visto
no site http://www.hoteltalisman.net
Beit Stambouli ou Beit Niyadu
Pertencia à família Stambouli e era uma belíssima mansão do bairro
judaico. Construída em 1868, foi fotografada em 1870 por Bonfils.
Diferentemente do que se pensa, a família não é originária de Istambul.
David Levy, pai de Aharon, um dos implicados no Caso Damasco, escolheu
este nome para se diferenciar dos inúmeros Levys que viviam na cidade.
Escolheu esse toponímico porque viajava muito a Istambul para cuidar de
assuntos jurídicos.
A suntuosidade da Beit Stambouli é mencionada em um depoimento de
1868 (divulgado apenas em 1993), feito por um grupo de pintores
orientalistas em visita ao Oriente Médio. A viagem foi organizada pelos
pintores Jean-Léon-Gerome e Wilhem de Famars-Testas, que possuíam uma
carta de apresentação de Adolphe Crémieux. Este advogado e estadista
francês foi quem, em julho de 1840, junto com Sir Moses Montefiore,
conseguiu libertar judeus presos em Damasco, sob a falsa acusação de
"assassinato ritual". (ver O Caso Damasco).
A carta abriu muitas portas, na cidade, aos artistas. Foram,
inclusive, convidados para jantar na Beit Stambouli, pois Aharon
Stambouli era um dos que haviam sido presos e condenados à morte, até
ser finalmente inocentado, graças à comitiva liderada por Crémieux e
Montefiore.
Provavelmente, a casa foi construída por Jacob Stambouli, sobrinho de
Aharon, e devia estar quase pronta em 4 de maio de 1868, quando
Jean-Léon-Gerome e Wilhem de Famars-Testas foram convidados para jantar.
Numa das fotografias da casa, tiradas por Bonfils, em 1870, pode-se
ver, à esquerda do liwan uma porta acima da qual há uma inscrição em
hebraico, com os dizeres "em memória", na primeira linha; na segunda, a
inscrição "Levy Stambouli ". A porta na direção de Jerusalém e os
dizeres em hebraico são indicações que o local era uma sinagoga
particular.
Em 1895, a casa foi comprada por Joseph Bay Liniado (1850-1942), rico
comerciante e financista judeu, e passou a ser conhecida como Beit
Niyadu, uma modificação do nome Liniado. Como conseqüência de alianças
matrimoniais entre as famílias, a casa continuou sendo ocupada pela
família Stambouli. Em 1943, Sabri Liniado a vendeu a uma instituição
norte-americana, quando se transferiu para Beirute. Durante a década de
1950 a casa funcionou como escola. Hoje pertence a um xeque xiita.
Beit Lisbona
No século 18, a proeminente família Lisbona, de bem-sucedidos
comerciantes, construiu um verdadeiro palácio nas vizinhanças da Grande
Sinagoga.
Com suas portas em madeira entalhada, enfeites em folha de ouro,
tetos pintados e incrustações nacaradas nas colunas em pedra esculpida, a
Beit Lisbona era, no entender de Isabel Burton, esposa do cônsul da
Inglaterra em Damasco, "a segunda casa mais bonita da cidade, perdendo
apenas para o Palácio Azem." Aristocrata inglesa e escritora, Isabel se
casara com Richard Francis, escritor e aventureiro, que já ocupara o
posto de cônsul em Santos, no Brasil. Em um de seus livros, Isabel
descreve assim uma visita que fez ao Khawaja, isto é, Senhor Lisbona, no
bairro judeu: "Era uma casa suntuosa, a mais bonita da cidade, suas
paredes revestidas de mosaicos dourados, o interior inteiramente
recoberto de mármore e, as colunas, em mármore e madrepérola".
Inúmeros são os depoimentos sobre tão vistosa riqueza e bom-gosto,
como o de Wilhem de Famars-Testas. Durante visita à cidade, jantou na
Beit Lisbona com membros de sua comitiva. Descreve assim o liwan para
onde ele e os outros convidados foramconduzidos, após o jantar, para
degustar os doces que eram servidos. Era um "luxuoso hall de entrada,
com uma abóbada muito alta, dando a impressão de estar suspenso em pleno
ar".
A requintada casa da família Lisbona foi fotografada pelo francês
Louis De Clercq, viajante do século 19. Tais fotos foram publicadas no
primeiro álbum sírio, intitulado "Cidades, monumentos e vistas
pitorescas na Síria". O livro registra sua viagem ao Oriente Médio, em
1859 e 1860.
Beit Lisbona está sendo restaurada por seu proprietário, um cristão, e talvez seja transformada em hotel.
Maktab 'Anbar
Na época em que Isabel Burton vivia em Damasco, outra luxuosa casa
estava sendo construída por um judeu, Yusuf Anbar, fora do bairro judeu.
Anbar havia adquirido todas as casas vizinhas, construindo a sua
mansão, com três amplos pátios, em estilo mais moderno.
Yusuf Anbar fizera sua fortuna na Índia. Segundo a lenda em torno de
seu nome, tinha ido para a Índia como criado. Ao voltar, tinha
encravados em seu turbante, o típico fez, lindos brilhantes. Quando, em
1890, Yusuf não conseguiu pagar abusivos impostos, as autoridades
otomanas confiscaram sua propriedade e a transformaram na escola Maktab
'Anbar. Restaurada pelo governo sírio em 1986, foi reaberta como sede da
Comissão para a Cidade Velha.
Bibliografia:
Keenan, Brigid, Damascus, Hidden Treasures of the Old City, Thames and HudsonArtigo publicado no site www.farhi.org, A description of the Farhi Houses, In 18th & 19th century Damascus
Artigo de Jacques Stambouli, La Maison Stambouli, publicado na revista L'Arche, novembro de 2007
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Fonte: http://www.morasha.com.br/comunidades-da-diaspora-1/os-palacios-dos-judeus-de-damasco.html
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